Lira III

De amar, minha Marília, a formosura
Não se podem livrar humanos peitos.
Adoram os heróis; e os mesmos brutos
Aos grilhões de Cupido estão sujeitos.
Quem, Marília, despreza uma beleza,
A luz da razão precisa;
E se tem discurso, pisa
A lei, que lhe ditou a Natureza.
Cupido entrou no Céu. O grande Jove
Uma vez se mudou em chuva de ouro;
Outras vezes tomou as várias formas
De General de Tebas, velha, e touro.
O próprio Deus da Guerra desumano
Não viveu de amor ileso;
Quis a Vênus, e foi preso
Na rede, que lhe armou o Deus Vulcano.
Mas sendo amor igual para os viventes,
Tem mais desculpa, ou menos esta chama:
Amar formosos rostos acredita,
Amar os feios de algum modo infama.
Que lê que Jove amou, não lê nem topa,
Que ele amou vulgar donzela:
Lê que amou a Dânae bela,
Encontra que roubou a linda Europa.
Se amar uma beleza se desculpa
Em quem ao próprio Céu, e terra move:
Qual é a minha glória, pois igualo,
Ou excedo no amor ao mesmo Jove?
Amou o Pai dos Deuses Soberano
Um semblante peregrino:
Eu adoro o teu divino,
O teu divino rosto, e sou humano.

Interpretação:

Nessa lira, vemos que novamente Tomás menciona Deuses, e compara o amor "terreno" com o amor Divino, deixa bem claro que até os Deuses amaram e que alguns deles acabaram não se dando muito bem, ele também lamenta muito que algumas pessoas não saibam amar e no final vemos que apesar dos Deuses serem belos, ele prefere Marília.

Arcadismo:

As características do Arcadismo que estão presentes na lira são o uso de elementos da mitologia e a imitação dos antigos.

Contexto Histórico:

Revolução Francesa, ele cita até em um certo momento da Lira "Aos grilhões do Cupido estão sujeitos."

Glossário:

Grilhões: Algemas de pés.

General de Tebas: Ligação com uma história onde os Deuses estão envolvidos.

Jove: Apelido para o Deus Júpiter. 

Dânae: Uma princesa que foi alvo do amor de Zeus, de quem teve um filho.

Samuel Dias Andrade/Número: 29/1ºF